Cai a noite, essa confidente dos solitários. Com ela traz o silêncio, sentado no ombro esquerdo, qual diabinho imponente. No ombro direito, por entre uma escorregadela ou outra, tenta sentar-se direita a melancolia, mas de tanta moleza que transmite, contagiou-se a ela também.
Nada se compara à noite. Única na sua essência, na sua ambiência, nas cores, nos sons que acarreta e até nos sentimentos que habitam as pessoas.
Fantasio-te na noite. Às vezes também de dia, mas sobretudo à noite. “Diz-se que o silêncio inspira medo porque, nesse vazio, ninguém é dono de nada”** , mas não há que recear este silêncio de que falo, porque ele transporta-me até ti, ou és tu que és trazido até ao meu cérebro e alagas os meus pensamentos. Sensação agradável na maior parte das vezes.
Estás aqui de novo. Que bom.
Não sei bem onde estamos, mas ouço o fogo crepitar, fruto da lenha com que o alimentas. Vejo-te sentado, a rabiscar qualquer coisa num bloco de notas. Ao teu lado, uma cadeira vazia, num convite mudo para mim e para o vestido branco primaveril que trago posto. Ainda não me viste e não o lamento; quero ficar a olhar-te, quero que este momento fique paralisado no tempo. Há momentos que devíamos ter o dom de guardar no álbum do coração como fotografias que podemos fazer perdurar e que nenhuma borracha vai apagar nem nenhum vento vai levar.
Caminho mais um pouco e tu continuas perdido entre as linhas do teu bloco e a caneta que passeia nos teus dedos. De repente páras, como se alguém te tivesse sussurrado algo ao ouvido; olhas e vês-me, mas não te levantas. Ficas fixo em mim e eu em ti, vejo as chamas reflectidas no teu olhar e tu a Lua no meu. Abres-te num sorriso e eu, quase que irreflectidamente, sorrio também com um reflexo involuntário. Fazes-me bem. Click, mais um momento congelado no álbum do coração.
**“Venenos de Deus, Remédios do Diabo”, Mia Couto
[como não sou adepta de posts muito grandes, optei por dividir este e acrescentar-lhe aqui um "CONTINUA..."]
segunda-feira, setembro 08, 2008
Saudade (parte I)
Palavra de Liliana Carvalho Lopes à(s) segunda-feira, setembro 08, 2008
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2 devaneios:
Nunca vi uma noite a cair...
Fonix...
Até ja sei onde te foste inspirar para tal expressão...
Inspiraste-te nas histórias do Asterix e Obelix... Não eram eles que tinham medo que o céu lhes caisse em cima???
Resposta: Sim, eram...
:)
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